decidi fazer um piquenique. sozinha. saí sem cesta nem manta, nem copos para brindar. meti-me no carro e deixei que me conduzisse. cheguei ao mar depois da mata onde pessoas verdadeiras faziam piqueniques verdadeiros, sentadas em cadeiras coladas a mesas que se dobram dezasseis vezes e ficam reduzidas a quase nada. não ocupam espaço, nem as mesas, nem as cadeiras. nem as pessoas. nem os garfos e as facas que levam à boca.
decidi que o meu piquenique seria no primeiro lugar onde conseguisse estacionar o carro, desde que fosse de frente para o mar. consegui. o lugar da ambulância.
não saí para comprar um gelado, mas podia muito bem ter saído. um gelado ou qualquer outra coisa que coubesse num piquenique.
dentro da minha bolha de ar condicionado, senti-me como um insecto. invisível e inoportuno. pronto a ser esmagado. um insecto de sangue frio que não sua nos dias de sol. um insecto com rodas.
conduzi-me de volta através dos piqueniques na mata. restavam só embalagens e folhas de jornais desportivos. saí do carro e meti o que consegui no lixo. amanhã voltaria com um cesto cheio de mim.