campainha
vou escrever muitas vezes a mesma frase à mão
fechar fonemas à chave num papel
e arquivá-lo entre duas teclas
volto já

obs.
há um homem que se cruza no meu caminho todos os dias em sítios improváveis. tem um andar rápido, decidido, e um olhar de quem já chegou antes das pernas e descansa à espera que o corpo se junte a ele. geralmente vejo-o na estrada das vinte e oito oliveiras. uma recta comprida, sem passeio, com vinte e oito árvores velhas e raquíticas, sem o brilho lustroso das centenárias que plantam nas rotundas. estas, pelo contrário, parecem crescer sobre o muro de pedra, sem terra que lhes alimente as raízes. será certamente uma ilusão de óptica provocada pela diferença de cota do terreno por detrás do muro. o homem tem um ombro ligeiramente descaído.


são muitos os canais da esperança
uns secos e quebradiços, estreitos
outros largos e cheios de ar, túneis de vento

atrevo-me a ser seiva e abrir pelas veredas tortas
madeira morta, branca, que o mar cuspiu para terra
arritmias

tenho um coração externo que pulsa se o outro pára
a minha vida é como uma corrida de estafetas
arranco ritmos a pedras, paus, sombras e sopros
arritmias controladas

faz hoje anos que o mundo é mundo

pelo menos para mim


*patente na associação cultural Mercado Negro, em Aveiro, até 19 de Outubro.
3ª a Sábado: 13h - 00h
Domingo: 15h - 00h
R. João Mendonça, 17
3800-200 Aveiro

*Selecção dos poemas
Mercado Negro

*Design e ilustrações
Menina Limão

manhã