dieta

no precário equilí
brio das horas
balanço o meu peso
peso o meu balanço
e não consigo andar direita
a dieta não se compadece
do lastro
e a gravidade suga-me a alma
mais do que devia
de dia
arrasto um saco de sombra
que o sol me impõe
à noite
sou toda sombra
e arrasto-me
saco de pele e s
obras
spleen

uma gaivota desaparece
atrás do som do sino das quatro
um melro sobe a uma ruína
e eu es
calo-me,
por mim acima,
fio de prumo, fio de fumo
imóvel numa cadeira de plástico

p
asseio

sol
i
dão
sol
i

l
ama
líquen lamiré
dois ou três passos
atrás de cada pé
fumo flores geada
a curva ao fundo da estrada
e eu num pino perfeito
de joelhos contra o peito

bebo chá
bebo chá e fumo um cigarro ao sol
bebo chá
bebo chá sem açúcar
bebo chá
bebo céu
bebo chão
bebo tempo
beijo o fumo
beijo o vento

janus

é estreito o corredor desta casa
há que passar de lado
roçando os ombros, o peito
as coxas e os calcanhares
a dada altura o corpo é parede e a pa
rede corpo
como se a verticalidade se impusesse
numa espécie de ética física
talas em vez de pórticos
um corredor sem portas
que desem
boca não se sabe onde
a cal cobre a pele de pó
e os dedos deixam um rasto de estrelas
sem frente nem verso


Tenho os pulmões encharcados em choro seco,
uma rocha plana que me aconchega o peito.
A tampa da escrivaninha
do meu quarto de menina
escondia papéis amachucados
com frases sobrepostas,
aparas e copos sujos de chocolate.
À frente, no seu suporte perfeito,
duas canetas
só para enfeitar.
Sempre gostei do cheiro das aparas
e dos bicos de lápis desfeitos,
o cheiro a estojo fechado.